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Opinião: De velho a velhaco


É minha gente, os antropólogos, quando forem estudar algumas personalidades que eram, ou diziam da vida pública, terão uma grande surpresa: descobrirão que estas nunca foram grande coisa do ponto de vista ético, moral e intelectual e que essas pessoas ao envelhecerem passaram de velhos a velhacos.

Ou quem sabe, enlouqueceram mesmo.....

O jovem poeta português Antero de Quental (1842-1891) passando uma descompostura no também poeta Antônio Feliciano de Castilho (1800-1875), com quem possuíam uma diferença de idade de quase 50 anos, dizia que estava seduzido pela poesia realista; este outro era um monumento da literatura portuguesa, apegado à estética romântica.

Embora Castilho fosse cego, pretendia-se uma espécie de observatório da literatura portuguesa e juiz dos vivos e dos mortos. E mereceu, então, de Quental aquelas palavras um tanto azedas, mas brilhantes.

Afinal, quem está impedido de ter 50 anos a menos de idade, que ao menos busque 50 a mais de reflexão.

Sobre as críticas de Castilho, Antero retrucou: “Dizer o quê? Talvez estas palavras: “Levanto-me quando os cabelos brancos de V. Exa. passam diante de mim. Mas o travesso cérebro que está debaixo e as garridas e pequeninas coisas que saem dele, confesso, não me merecem nem admiração nem respeito, nem ainda estima. A futilidade num velho desgosta-me tanto como a gravidade numa criança. V.Exa. precisa menos cinquenta anos de idade, ou então mais cinquenta de reflexão. É por estes motivos todos que lamento do fundo da alma não me poder confessar, como desejava, de V.Exa. nem admirador nem respeitador”.

É preciso envelhecer sem perder a ternura e a sabedoria. Cabelos brancos não implicam automaticamente sabedoria.

Grande Cortella (Mário Sérgio) já nos advertia para nos aproximarmos dos idosos e não dos velhacos, pois não podemos confundir os termos. Velho é quem já está fechado dentro de si, que se julga o dono do mundo e da razão, que todos devem obedecê-lo, que somente ele sabe e conhece, que tudo ele tem, e que todos estão errados. O idoso não, pessoa simples, sempre disposta a aprender e humilde.

Afinal, encerro com Cortella novamente: "Faça o teu melhor, na condição que você tem, enquanto você não tem condições melhores para fazer melhor ainda.".

Que possamos envelhecer, mas não nos tornarmos velhacos.

 

*JOÃO PEDRO DA PAZ ARAÚJO, é professor, escritor, perito judicial, bacharel em direito e político. Contato: gabinete@joaopedrodapaz.com.br